4 de janeiro de 2016

Heart of a Dog

 
 
 

Ver este filme não é muito diferente de assistir a um concerto de Laurie Anderson. Habitualmente, nestes concertos são mais importantes as histórias que a artista conta do que a música que se ouve. Contudo, enquanto os concertos da artista não se organizam necessariamente em torno de um tema unificador, em Heart of a Dog (2015) conseguimos facilmente identificar o eixo central das histórias: o tópico da morte.  Este suscita desde reflexões mais gerais, relacionadas, por exemplo, com a ameaça terrorista, a pensamentos e narrações mais particulares do desaparecimento de entes queridos. À superfície, a morte mais comentada em Heart of a Dog é a de Lollabelle, a cadela rat terrier da artista. Logo no início do filme, o estranho sonho em que a artista dá à luz Lolabelle clarifica de imediato o estatuto da relação entre a artista e a cadela. É curioso, no entanto, que num filme sobre a morte a artista nunca se refira ao desaparecimento do marido, Lou Reed, em 2013. Antes do genérico final aparece uma fotografia dele, mas Laurie Anderson nunca refere directamente a morte do músico. Por esse motivo, ficamos com a sensação de que o mais importante deste filme não pôde ser dito. As reflexões sobre a morte de Lolabelle e de pessoas próximas podem ser vistas como um estratagema para começar a abordar indirectamente a morte mais importante, aquela que ainda não se consegue transformar em arte. Circular em torno da ausência e do não-verbalizado é a estratégia principal de que a construção deste filme depende. A dada altura, Laurie Anderson comenta: «Até agora, na minha vida, vi três fantasmas. Um deles foi o de Gordon Matta-Clark.» Ficamos a pensar em quem terão sido os outros dois.